Isak Gerson, líder do Copimismo: Seus fiéis citam Coríntios, capítulo 1, versículo 11:1: “Me imitem, assim como eu imito Cristo” |
Tarde da noite. Um grupo de homens e mulheres com idade entre 20 e 60
anos se reúne em uma sala cujo endereço é protegido a sete chaves. Eles
ligam seus computadores e começam a digitar. Das páginas da internet
coletam dados de todo tipo, sigilosos ou não, e os espalham. Primeiro,
compartilham arquivos uns com os outros. E, depois, com o mundo. Eles
não fazem parte de uma sociedade secreta, nem são informantes do
Wikileaks, mas religiosos da Igreja Missionária do Copimismo.
Fundada em 2006 na Suécia, terra onde surgiu o Partido Pirata, a seita
do Copimismo tem como preceito copiar como forma de difundir
conhecimento. O fundamento está na Bíblia, garantem os copimistas, que
citam Coríntios, capítulo 1, versículo 11:1: “Me imitem, assim como eu
imito Cristo”. Para os fiéis dessa pouco convencional igreja,
compartilhar informação por meio de downloads de CDs, DVDs e até
softwares é sagrado, mesmo que isso signifique infringir a legislação
sobre direitos autorais. Embora vivam no limite da legalidade, os
seguidores ainda não tiveram problemas com a justiça.
“Podemos ser presos pelo que fazemos. Por isso, tentamos preservar
nossas identidades por muito tempo”, diz o estudante de filosofia sueco
Isak Gerson, de apenas 20 anos de idade, que diz ter sido eleito líder
espiritual da Igreja e um de seus fundadores. Apesar da pouca idade,
Gerson jura que só copia por fé – e não para, como muitos da sua faixa
etária, economizar uma grana deixando de comprar discos e filmes.
Foi aliás pelo desejo de tornar o Copimismo sério aos olhos dos
“leigos” que Gerson apelou às autoridades suecas para que o
reconhecessem como uma verdadeira religião. E, por mais absurdo que possa parecer, o governo da Suécia emitiu no fim do ano passado o documento de registro.
“Agora que fomos reconhecidos, queremos ser ouvidos”, diz o líder,
assumindo um discurso pretensamente sério. “Nós não acreditamos no
sistema atual de direitos autorais, por isso queremos mudá-lo. Nós
participamos da greve geral contra o Sopa e as propostas americanas
contra a pirataria. Não vemos essa questão apenas sob o ponto de vista
dos direitos autorais, mas sim como um ataque em grande escala à
internet. Por isso, precisamos pará-los.”
Mas, como não é bobo nem nada, o papa do Copimismo dá a seus fiéis,
entre outras recomendações, a de evitar registros de suas atividades
religiosas. Sem prova, não há crime, já diria um sábio detetive
livresco. Mas, para o advogado americano Steven Johnson, da firma Jones
Day, Gerson e seus amigos podem ter achado uma brecha constitucional
capaz de blindá-lo. “Nos Estados Unidos, a liberdade religiosa é
garantida pela primeira emenda. E a maioria dos países mais democráticos
não interfere na crença das pessoas, porque é contra a lei. Me parece
que ele está muito bem informado sobre a situação legal em que se
encontra.”
Liturgia – Como toda religião, essa segue uma liturgia
própria. Mas não tem Bíblia, Torá ou Corão. Apenas uma constituição, em
que se lê coisas como “Disseminar informações é ético” e "Para
pertencer à comunidade copimista, não é preciso fazer parte de nenhuma
organização. Basta respeitar e adorar a mais santa das santas: a
informação". Ou ainda a recomendação para que os fiéis não guardem
registros de suas atividades religiosas – uma forma, para o bem ou para o
mal, de burlar as leis de direitos autorais.
Entre os fiéis, há uma colega de sala de Gerson na faculdade de
Uppsala, Malin Ahnberg, de 20 anos, um dos filiados do Partido Pirata
sueco que abraçaram com fervor a nova fé. Embora seja adepta da religião
há pouco menos de um ano, Malin diz – sem o menor pudor e não sem
orgulho – que todos seus trabalhos escolares sempre foram fruto do
Copimismo. “Eu costumava copiar livros e informações para meus
seminários”, conta a garota. “Algumas pessoas são mais iluminadas, como
Isak. Ele tem feito isso há muito tempo”, explica.
Opinião parecida vem da bióloga americana Erica Stone, de 32, que só
ouviu falar do Copimismo há dois meses, mas garante que partilha das
ideias da religião desde o seu nascimento. “Todos os dias, células são
copiadas no meu corpo. A cópia é a única razão para a raça humana
existir. Essa condição nos humaniza. A cópia guarda os segredos do nosso
passado, presente e futuro”, diz Stone.
Uma rede social – O preceito principal, copiar e
multiplicar, está sendo seguido. Até agora, a igreja sueca reconheceu
iniciativas semelhantes em mais de treze países e contabiliza cerca de
5.000 membros. Nesta semana, parece ter sido a vez de os brasileiros
entrarem para o time. Uma comunidade recém-criada no Facebook batizada
de Igreja Kopimista do Brasil
conta com seis membros, mas tem verniz debochado. Na única imagem
publicada até agora pelo perfil, há uma imagem católica com a legenda
“Nossa Senhora dos Downloads Impossíveis”. O criador da página
brasileira não respondeu ao contato do site de Veja.
O porta-voz do Partido Pirata brasileiro, Luiz Felipe Cruz, afirma que
muitos membros do partido simpatizam com o Copimismo, mas não são
praticantes. “Tudo que acontece ao nosso redor agrega conhecimento para
desenvolver um pensamento crítico. O conhecimento é útil para o
desenvolvimento da nossa sociedade”, afirma Cruz. Segundo ele, o partido
já iniciou uma deliberação para formar a opinião do movimento sobre o
Copimismo. E dá para algum pirata ser contra?
Via: EXAME.com
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